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segunda-feira, 26 de agosto de 2013

SERENATAS - Catulle Mendes


SERENATAS
Por Catulle Mendes 
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I
A madrugada ria-se em festim, 
Tu me chamaste: "vem", e logo vim. 
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Mais tarde um pouco, "canta" me disseste, 
E eu cantei tua graça, alma terrestre. 
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Mas veio a noite (ó noite em que me vi!)
Tu me mandaste: "parte" e eu não parti.
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II
Mesmo assim arrufada, adoro ainda
O teu semblante, quando se enfurece, 
Pois nesse olhar, que um puro esmalte alinda
Suave a própria cólera parece. 
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O Amor, que as delicadas leis ensina, 
Não raro, inda que sempre doce e liso, 
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No lábio que nos prende e nos fascina, 
Faz suceder os momos ao sorriso. 
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E, prudente, concede aos namorados, 
Para curar as frouxidões morosas, 
Que afetam sempre os peitos bem amados, 
As rixas, esses látegos de rosas. 
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III 
Teu coração é de ouro fino; tudo
É nítido e leal nessa alma pura; 
Mas a esperança que me foi escudo, 
Vai descambando em dúvida e tortura. 
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Ah! minha irmã, eu tenho visto aos centos,
À hora lânguida em que a noite tomba, 
Dispersos meus sonhos pelos ventos, 
Como as penas dispersas de uma pomba. 
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IV
A fria lua que rola
Com languidez de crioula, 
Sonha dolorosamente 
No infinito céu dormente, 
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Enquanto as cristalinas
Fonte, em vagas surdinas, 
Se exala nos tristes ares
O pranto dos nenufares. 
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V
Canta jovem pastor no bosque a sós, 
E o eco vaidoso diz: "sou eu a voz!"
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Sob a vidraça que a cortina vela, 
A lâmpada murmura: "eu sou estrela!"
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Nos lagos, sobre que pende a ramagem, 
"Quem existe sou eu" diz sua imagem. 
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Porém, mais falsa, ó sina que deploro! 
Era a voz protestando-me: "eu te adoro!"
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BREVE BIOGRAFIA 
Catulle Mendes, poeta e romancista francês, oriundo de uma família de judeus portugueses, nasceu em Bordeaux em 1841. Vindo para Paris em 1860, fundou a "Revista Fantasista", onde se estrearam Teófilo Gautier, Teodoro de Banville, Baudelaire, Villiers de Lisle Adam, os dois Daudet, Vacquerie, Houssay, etc., que depois se juntaram na revista "Art" os nomes de Lecontte de Lisle, Sully Prudhomme, Coppée, Verlaine e Mallarmé. Escritor pouco profundo, é, no entanto, habilíssimo e duma rara produtividade e largueza de aptidões. As suas obras principais são: poesias, "Contes Épiques"; "Hesperus"; "Serenades"; "Soirs moroses"; "Soleikl de minuit"; romances, "Zo'har"; "La Femmé enfant"; "La grande Maquet"; obras de teatro, "Meres ennemites", 1882: " La femme de Tabarin" e principalmente "La Vierge d'Avila", em que a protagonista é Santa Teresa; e contos e novelas licenciosas, com "Pour lire au bain"; "JUpe courte"; "Les monstres parisiens", "Les Boudairs de verre", etc.  Com R. Lesclide traduziu ainda as "Confissões" de Cagliostro com o título "La divine aventure, 1881. Morreu de um desastre na linha de Gendaya para Bordeus. 
Nicéas Romeo Zanchett 
                                         Pintura de Renoir : As filhas de Catulle Mendes. 



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