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domingo, 23 de novembro de 2014

A SOMBRA DO QUADRANTE - Por Eugênio de Castro

PARA PENSAR NA VIDA QUE LEVAMOS 
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Murmúrio d'água na clepsidra gotejante, 
Lentas gotas de som no relógio da torre,
Fio de areia na ampulheta vigilante, 
Leve sombra azulando a pedra do quadrante.
Assim se escoa a hora, assim se vive e morre...
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Homem que fazes tu? Para que tanta lida, 
Tão doidas ambições, tanto ódio e tanta ameaça; 
Procuremos somente a Beleza, que a vida 
É um punhado infantil de areia ressequida,
Um som d'água ou de bronze e uma sombra que passa...
NOTA: Nesta obra, que até parece ter iluminação divina, Eugênio de Castro nos faz refletir sobre o mundo consumista em que vivemos. Vale apena acumular tanto poder e dinheiro, se brevemente deixaremos nossa matéria e voltaremos a ser simples anergia cósmica?
Nicéas Romeo Zanchett 

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

TABAS INDÍGENAS - Frei Santa Rita Durão



TABAS INDÍGENAS 
De: O Caramuru 
No Recôncavo ameno um posto havia 
De troncos imortais cercado à roda, 
Trincheira natural, com que impedia
A quem quer penetrá-lo a entrada toda; 
Um plano vasto no seu centro abria, 
Aonde, edificando à pátria moda, 
De troncos, varas, ramos, vimes, canas, 
Formam, como em quadro, oito cabanas. 
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Qualquer delas com mole volumosa  
Corre direita em linhas paralelas; 
E mais comprida aos lados, que espaçosa, 
Não tem paredes, ou colunas belas:
Um ângulo no cume e faz vistosa,
E coberta de palmas amarelas
Sobre árvores se estriba altas, e boas, 
De seiscentas capaz, ou mil pessoas. 
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Qual o velho Noé na imensa barca, 
Que a bárbara cabana em tudo imita, 
Ferozes animais provido embarca, 
Onde a turba brutal tranquila habita; 
Tal o rude tapuia na grande arca,
Ali dorme, ali come, ali medita, 
Ali se faz humano, e de amor mole,
Alimenta a mulher, e afaga a prole.
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Dentro da grã choupana à cada passo
Pende de lenho a lenho a rede extensa, 
Ali descanso toma o corpo lasso,  
Ali se esconde a marital licença; 
Repousa a filha no materno abraço
Em rede especial, que tem suspensa; 
Nenhum se vê (que é raro) em tal vivenda
Que mulher de outrem, nem que a filha ofenda.
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Ali, chegando a esposa fecunda
À termo feliz, nunca se omite
De por na rede o pai a prole amada, 
Onde o amigo, e parente o felicite;
E como se a mulher sofrera nada,
Tudo ao pai reclinada então se admite,
Qual fora, tem sido em modo sério
Seu próprio, e não das mães o puerpério. 
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Quando na rede encosta o tenro infante, 
Pinta-o de negro todo, e de vermelho, 
Um pequeno arco põe, frecha volante, 
E um bom cutelo ao lado; e um tom de velho, 
Com discurso patético e zelante
Vai-lhe inspirando o paternal conselho: 
Que seja forte diz,(como se o ouvisse)
Que se saiba vingar, que não fugisse. 
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Dá-lhe depois o nome, que apropria
Por semelhança, que ao infante iguala, 
Ou com que o espera celebre algum dia, 
Se não é por defeito que o assinala; 
A algum na fronte o nome se imprima; 
ou pintam no verniz, que tem por gala, 
E segundo a figura se lhe observa,
Dão-lhe o nome de fera, fruto, ou erva. 
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Trabalha em tanto a mãe sem nova cura, 
Quando o parto conclui, e em tempo breve, 
Sem mais arte que a provida natura, 
Sente-se lesta, e sã, robusta, e leve; 
Feliz gente, se unisse com fé pura
A sóbria educação, que simples teve!
Que o que a nós nos faz fracos, sempre estimo, 
Que é mais, que pena e dor, melindre e mimo. 
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Vai com o adulto filho à caça, ou pesca
O solícito pai pelo alimento; 
O peixe à mulher traz, e a carne fresca,
E à tenra prole a fruta por sustento; 
A nova provisão sempre refresca, 
E dá nesta fadiga um documento
que quem nega o sustento a quem deu vida, 
Que ser pai, por fazer-se um parricida. 
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Que, acontece que a enfermar-se venha, 
Concorre com piedade a turba amiga; 
E por dar-lhe um remédio, que convenha, 
Consultam-no entre si com gente antiga; 
Buscam quem de erva saiba, ou cura tenha, 
Que possa dar alívio ao que periga; 
Ou talvez sangram numa febre ardente, 
Servindo de lanceta um fino dente. 
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Mas vendo-se o mortal já na agonia, 
Sem ter para o remédio outra esperança, 
Estima a bruta ação mui pia
Tirar-lhe a vida com maça ou lança; 
Se morre o tenro filho, a mãe seria
Estimada cruel, quando a criança,
Que pouco antes ao mundo dela veio, 
Não torna ao seu lugar no próprio seio.
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Tal era o povo rude, e tal usança
Se lhe vê praticar no vício iluso;
Tudo nota Diogo, na esperança
De corrigir por fim tão cego abuso. 
No lugar da cabana, em que descansa
Menos da gente, e multidão confuso, 
Põe-lhe a rede Gupéva, que o convida, 
De rica e mole pluma entretecida. .
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BREVE BIOGRAFIA 
             Frei José de Santa Rita Durão, foi um poeta brasileiro; nasceu em Cata-Preta, Minas Gerais, em 1720, e faleceu em 1784. Era orador em teologia pela Universidade de Coimbra onde foi lente opositor dessa cadeira. Escreveu "O Caramuru, 1781", poema épico em que descreve a história meio fabulosa da colonização da Bahia por Diogo Alvares, ou Caramuru, como lhe chamavam os índios. 
Nicéas Romeo Zanchett 



domingo, 16 de novembro de 2014

SONETOS DO AMANTE - Antônio Félix de Souza

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Obra de Romeo Zanchett 
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SONETOS DO AMANTE 
Eternizar o amor que fora eterno
embora só vivesse dois instantes:
um quando ao céu me alçou - a um céu sem antes; 
depois, ao acender em mim o inferno; 
banida do presente, em lago terno
voltes a me banhar e desencantes
o mar que chama em vão, de ondas cortantes
partindo do meu ser, banhando o eterno. 
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Eternizar o amor de um só momento
e quanto mais perdê-lo, mais ganhá-lo. 
E quanto mais ganhá-lo, mais alento
trazer no que recordo e no que falo, 
para que possa, em febre e em sentimento
em mármore e em saudade, eternizá-lo.

BIOGRAFIA SIMPLIFICADA 
Afonso Félix de Souza, nasceu em 1925 - Jaraguá, estado de Goiás. 
Ajudem-me a melhorar esta biografia, fazendo comentários. 
Nicéas Romeo Zanchett