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quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

AMOR FUGITIVO - Por Moscho - Poeta de Siracusa

Desenho de Romeo Zanchett 
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AMOR FUGITIVO 
Pelo seu filho Amor em altas vozes
Bradava Vênus: se alguém viu acaso 
Nalguma encruzilhada Amor vagando, 
É o meu fugitivo. 
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Alvissaras darei, se me descobres, 
Terás por paga um osculo de Vênus;
Mas se mo trazes, não um simples beijo, 
Mais alto prêmio aguarda. 
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Bons sinais o menino tem; tu podes 
Entre vinte meninos conhecê-lo; 
Não é alvo do corpo; é semelhante
À cor do vivo fogo.
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Seus olhos acres são cintilantes;  
A tenção má, porém palavras meigas; 
E nunca fala como pensa, e as vozes 
São como o mel, suaves. 
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Mas quando se ira, o coração reponta
Feroz, e enganador, não diz verdade; 
É menino doloso, e nos seus brincos
Há só atrocidades. 
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Tem bom cabelo, desenvolto gesto; 
Pequenas as mãozinhas são; mas certo
Atiram longe; atiram-te Acerodonte,
E ao mesmo Rei do Inferno. 
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O corpo nu, o espírito rebuçado;
E qual ave veloz, que os ares fende, 
A uns, a outros voa, homens, mulheres, 
Nas entranhas se assenta. 
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Tem arco mui pequeno, e sobre o arco
Trás embebida a dura seta ervada;
Pequena seta, mas veloz alcança
A região Etérea.
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Carrega aos ombros uma aljava de ouro; 
Mas dentro dela fatais flechas guarda; 
Com elas a mim mesma muitas vezes
Me tem ferido o peito. 
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Sim; todas estas coisas são danosas, 
Todas; mas sobretudo é tenebrosa
Uma pequena facha, que ele acende, 
Que ao mesmo sol abrasa.
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Se mo houveres à mão, traze-mo preso, 
Não te mova a piedade; e se tu o vires
Alguma vez em lágrimas banhado, 
Aguarda, não te engane. 
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Inda que ele ria, traze-o preso; 
Pois já se te quiser beijar no rosto, 
Ah! foge que o seu beijo é peçonhento, 
E são veneno os beiços. 
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Se te disser: toma estas coisas, dou-te
Todas as minhas armas; não toques; 
São dádivas dolosas, que as tem todas
Em vivo fogo tintas. 
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Paisagem turística de Siracusa.
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BREVE BIOGRAFIA 
Moscho foi um poeta bucólico da escola de Teócrito; nasceu em Siracusa no século II a.C.  Foi discípulo de Aristarco e, ao que tudo indica, compôs em prosa alguns tratados sobre assuntos filológicos. Com o seu nome temos oito poemas ou fragmentos, dos quais os mais interessantes são o fragmento Europa, o Canto fúnebre em honra a Bion, e o Amor fugitivo. Dos idílios, apenas quatro são conhecidos. 
Nicéas Romeo Zanchett  





AMOR E PSICHÉ Por Eugênio de Castro

 Obra de Van Dick 
Obra de Canova 
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à procura do amor, que anda tontinho
Por alta ninfa de argentino seio, 
Psiché, do bosque rumoroso a meio, 
Sente no calcanhar cruciante espinho. 
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Aos gritos seus, o Amor, como um veadinho, 
Pulando chega em ofegoso anseio,
Com jeito o acúleo tira e com receio, 
E a ferida oscula cheio de carinho. 
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E então a pobre diz, sorrindo e aos ais, 
Vendo dançar todo o arvoredo em roda; 
- "Se o preço de tais beijos são abrolhos, 
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"Prouvera aos sábios deuses imortais,  
Que mil abrolhos me picassem toda, 
Nos pés, nas mãos, no peito e até nos olhos!"
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BREVE BIOGRAFIA 
 Eugênio de Castro foi um poeta e prosador português; nasceu em 1861, e foi professor de francês na Escola Industrial Brotero, em Coimbra, onde sempre viveu. Entre grande número de livros que publicou destacam-se Jesus de Nazaré, 1885; Sylva, 1894; Belkiss, 1894; Salomé e outros poemas, 1806; O Rei Galaor, 1897; Saudades do céu, 1899; Constança, 1900; Poesias escolhidas, 1902; O Anel de Policrates, 1907. 
Nicéas Romeo Zanchett 

LÍRICAS - A ESPADA DO POETA - Por Alceu de Mitinene

Poetisa Safo e Alceu de Mitilene - Poeta Grego
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LÍRICAS 
A ESPADA DO POETA 
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Eu coroarei de mirto a minha espada, 
Como a de Harmódio, honrada, 
E como a de Aristógiton, o forte, 
Quando ao sevo tirano deram morte,
E Atenas libertada
Foi à igualdade antiga restaurada.
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Tu não morreste, Harmódio, oh não! tu gozas
Nessas ilhas ditosas
Serena vida com os heróis que aí moram, 
E onde, cremo, demoram 
Diomedes, o valente,
E Aquiles, o veloz, eternamente. 
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De mirto a minha espada
trarei como Aristógiton coroada,
E como Harmódio, o forte
Que à vingança a reserva,
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Quando, nos sacrifícios de Minerva,
Ao tirano Hipparco deram morte. 
Em prezada memória
Viverá para sempre eternamente.
Harmódio, a tua glória, 
E a tua, Aristógiton valente, 
Que o tirano matastes, 
E a liberta cidade
O usurpado direito restaurastes
Da primeira igualdade. 
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Júpiter chove,, pelo céu se enturva
Fremente o ar; 
Túrgidas crescem as torrentes grossas
De água a jorrar. 
Frígido inverno! morra nas fogueiras
Do roxo lar. 
Corra-nos vinho, franco, de mão larga, 
Vamos, virar!
Beba-se, e já; porque a luz havemos
 Ainda esperar? 
Rápido é o dia, lentos são pesares, 
Maus de acabar; 
Deu-no-lo, o vinho, de Semelle o filho
Para os matar. 
Válidos copos, um a um, cá dentro
Se vão juntar;
E áspera luta travam na cabeça,
Que hão de quebrar
Água?... mostrai-lha; duas vezes vinho
A tresdobrar! 
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BREVE BIOGRAFIA 
Alceu de Mitilene foi um grande poeta lírico grego; nasceu em Mitilene, ilha de Lesbos em 611 a.C. e morreu em 580 a.C. - Viveu na ilha de Lesbos e foi contemporâneo de Safo a grande poetisa grega. Lamentavelmente, muito pouco nos resta de sua obra.
Nicéas Romeo Zanchett 




sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

LENDO A ILÍADA - Por Olavo Bilac

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Ei-lo, o poema de assombros, céu cortado
De relâmpagos, onde a alma potente
De Homero vive, e vive eternizado
O espantoso poder da argiva gente. 
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Arde Troia... De rastos passa atado
O herói ao carro do rival, e, ardente, 
Bate o sol sobre um mar ilimitado
De capacetes e de sangue quente. 
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Mais que as armas, porém, mais que a batalha, 
Mais que os incêndios, brilha o amor que ateia
O ódio e entre os povos a discórdia espalha: 
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- Esse amor que ora ativa, ora asserena
A guerra, e o heroico Páris encadeia
Aos curvos seios da formosa Helena. 
Olavo Bilac 
Atualização: Nicéas Romeo Zanchett 




domingo, 23 de novembro de 2014

A SOMBRA DO QUADRANTE - Por Eugênio de Castro

PARA PENSAR NA VIDA QUE LEVAMOS 
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Murmúrio d'água na clepsidra gotejante, 
Lentas gotas de som no relógio da torre,
Fio de areia na ampulheta vigilante, 
Leve sombra azulando a pedra do quadrante.
Assim se escoa a hora, assim se vive e morre...
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Homem que fazes tu? Para que tanta lida, 
Tão doidas ambições, tanto ódio e tanta ameaça; 
Procuremos somente a Beleza, que a vida 
É um punhado infantil de areia ressequida,
Um som d'água ou de bronze e uma sombra que passa...
NOTA: Nesta obra, que até parece ter iluminação divina, Eugênio de Castro nos faz refletir sobre o mundo consumista em que vivemos. Vale apena acumular tanto poder e dinheiro, se brevemente deixaremos nossa matéria e voltaremos a ser simples anergia cósmica?
Nicéas Romeo Zanchett 

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

TABAS INDÍGENAS - Frei Santa Rita Durão



TABAS INDÍGENAS 
De: O Caramuru 
No Recôncavo ameno um posto havia 
De troncos imortais cercado à roda, 
Trincheira natural, com que impedia
A quem quer penetrá-lo a entrada toda; 
Um plano vasto no seu centro abria, 
Aonde, edificando à pátria moda, 
De troncos, varas, ramos, vimes, canas, 
Formam, como em quadro, oito cabanas. 
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Qualquer delas com mole volumosa  
Corre direita em linhas paralelas; 
E mais comprida aos lados, que espaçosa, 
Não tem paredes, ou colunas belas:
Um ângulo no cume e faz vistosa,
E coberta de palmas amarelas
Sobre árvores se estriba altas, e boas, 
De seiscentas capaz, ou mil pessoas. 
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Qual o velho Noé na imensa barca, 
Que a bárbara cabana em tudo imita, 
Ferozes animais provido embarca, 
Onde a turba brutal tranquila habita; 
Tal o rude tapuia na grande arca,
Ali dorme, ali come, ali medita, 
Ali se faz humano, e de amor mole,
Alimenta a mulher, e afaga a prole.
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Dentro da grã choupana à cada passo
Pende de lenho a lenho a rede extensa, 
Ali descanso toma o corpo lasso,  
Ali se esconde a marital licença; 
Repousa a filha no materno abraço
Em rede especial, que tem suspensa; 
Nenhum se vê (que é raro) em tal vivenda
Que mulher de outrem, nem que a filha ofenda.
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Ali, chegando a esposa fecunda
À termo feliz, nunca se omite
De por na rede o pai a prole amada, 
Onde o amigo, e parente o felicite;
E como se a mulher sofrera nada,
Tudo ao pai reclinada então se admite,
Qual fora, tem sido em modo sério
Seu próprio, e não das mães o puerpério. 
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Quando na rede encosta o tenro infante, 
Pinta-o de negro todo, e de vermelho, 
Um pequeno arco põe, frecha volante, 
E um bom cutelo ao lado; e um tom de velho, 
Com discurso patético e zelante
Vai-lhe inspirando o paternal conselho: 
Que seja forte diz,(como se o ouvisse)
Que se saiba vingar, que não fugisse. 
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Dá-lhe depois o nome, que apropria
Por semelhança, que ao infante iguala, 
Ou com que o espera celebre algum dia, 
Se não é por defeito que o assinala; 
A algum na fronte o nome se imprima; 
ou pintam no verniz, que tem por gala, 
E segundo a figura se lhe observa,
Dão-lhe o nome de fera, fruto, ou erva. 
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Trabalha em tanto a mãe sem nova cura, 
Quando o parto conclui, e em tempo breve, 
Sem mais arte que a provida natura, 
Sente-se lesta, e sã, robusta, e leve; 
Feliz gente, se unisse com fé pura
A sóbria educação, que simples teve!
Que o que a nós nos faz fracos, sempre estimo, 
Que é mais, que pena e dor, melindre e mimo. 
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Vai com o adulto filho à caça, ou pesca
O solícito pai pelo alimento; 
O peixe à mulher traz, e a carne fresca,
E à tenra prole a fruta por sustento; 
A nova provisão sempre refresca, 
E dá nesta fadiga um documento
que quem nega o sustento a quem deu vida, 
Que ser pai, por fazer-se um parricida. 
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Que, acontece que a enfermar-se venha, 
Concorre com piedade a turba amiga; 
E por dar-lhe um remédio, que convenha, 
Consultam-no entre si com gente antiga; 
Buscam quem de erva saiba, ou cura tenha, 
Que possa dar alívio ao que periga; 
Ou talvez sangram numa febre ardente, 
Servindo de lanceta um fino dente. 
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Mas vendo-se o mortal já na agonia, 
Sem ter para o remédio outra esperança, 
Estima a bruta ação mui pia
Tirar-lhe a vida com maça ou lança; 
Se morre o tenro filho, a mãe seria
Estimada cruel, quando a criança,
Que pouco antes ao mundo dela veio, 
Não torna ao seu lugar no próprio seio.
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Tal era o povo rude, e tal usança
Se lhe vê praticar no vício iluso;
Tudo nota Diogo, na esperança
De corrigir por fim tão cego abuso. 
No lugar da cabana, em que descansa
Menos da gente, e multidão confuso, 
Põe-lhe a rede Gupéva, que o convida, 
De rica e mole pluma entretecida. .
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BREVE BIOGRAFIA 
             Frei José de Santa Rita Durão, foi um poeta brasileiro; nasceu em Cata-Preta, Minas Gerais, em 1720, e faleceu em 1784. Era orador em teologia pela Universidade de Coimbra onde foi lente opositor dessa cadeira. Escreveu "O Caramuru, 1781", poema épico em que descreve a história meio fabulosa da colonização da Bahia por Diogo Alvares, ou Caramuru, como lhe chamavam os índios. 
Nicéas Romeo Zanchett 



domingo, 16 de novembro de 2014

SONETOS DO AMANTE - Antônio Félix de Souza

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Obra de Romeo Zanchett 
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SONETOS DO AMANTE 
Eternizar o amor que fora eterno
embora só vivesse dois instantes:
um quando ao céu me alçou - a um céu sem antes; 
depois, ao acender em mim o inferno; 
banida do presente, em lago terno
voltes a me banhar e desencantes
o mar que chama em vão, de ondas cortantes
partindo do meu ser, banhando o eterno. 
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Eternizar o amor de um só momento
e quanto mais perdê-lo, mais ganhá-lo. 
E quanto mais ganhá-lo, mais alento
trazer no que recordo e no que falo, 
para que possa, em febre e em sentimento
em mármore e em saudade, eternizá-lo.

BIOGRAFIA SIMPLIFICADA 
Afonso Félix de Souza, nasceu em 1925 - Jaraguá, estado de Goiás. 
Ajudem-me a melhorar esta biografia, fazendo comentários. 
Nicéas Romeo Zanchett 





domingo, 17 de agosto de 2014

ADAMASTOR - Dos Lusíadas - CAMÕES

Desenho de Romeo Zanchett 
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ADAMASTOR 
 Porém já cinco sóis eram passados, 
Que dali nós partiramos, cortando 
Os mares nunca doutrém navegados, 
Prósperamente os ventos soprando, 
Quando uma noite, estando descuidados
Na cortadora prôa vigiando, 
Uma nuvem, que os ares escurece, 
Sobre nossas cabeças aparece. 
Tão temerosa vinha e carregada, 
Que pôs nos corações um grande medo; 
Bramindo o negro mar de longe brada
Como se desse em vão nalgum rochedo, 
"Ó Potestade" disse "sublimada",
Que ameaço divino ou que segredo
Este clima e este mar nos apresenta, 
Que mor causa parece que tormenta!
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Não acabava, quando uma figura
Se nos mostra no ar, robusta e válida, 
De disforme e grandiosíssima estatura, 
O rosto carregado, a barba esquálida, 
Os olhos encovados, e a postura
Medonha e má, e a cor terrena e pálida, 
Cheios de terra e crespos os cabelos, 
A boca negra, os dentes amarelos. 
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Tão grande era de membros, que bem posso
Certificar-te que este era o segundo
De Rhodes estranhíssimo Colosso, 
Que um dos sete milagres foi do mundo. 
Com tom de voz nos fala horrendo e grosso, 
Que pareceu sair do mar profundo: 
Arrepiam-se as carnes e ocabelo
A mim e a todos só de ouví-lo e vê-lo. 
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E disse: "Ó gente ousada, mais que quantas
No mundo cometeram grandes coisas, 
Tu, que por guerras cruas, tais e tantas, 
E por trabalhos vãos nunca repousas, 
Pois os vedados términos quebrantas
E navegar meus longos mares ousas, 
Que eu tanto tenho ha já que guardo e tenho, 
Nunca arados de estranho ou próprio lenho, 
Pois vens ver os segredos escondidos
Da natureza e do húmido elemento, 
A nenhum grande humano concedidos
De nobre ou de imortal merecimento, 
Ouve os danos de mim, que apercebidos
Estão a teu sobejo atrevimento
Por todo o largo mar e pela terra
Que ainda hás de subjugar com dura guerra. 
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Sabe que quantas náus esta viagem, 
Que tu fazes, fizerem de atrevidas, 
Inimigas terão esta paragem
Com ventos e tormentos desmedidas; 
E na primeira armada que passagem 
Fizer por estas ondas insofridas, 
Eu farei de improviso tal castigo, 
Que ja maior o dano que o perigo. 
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Aqui espero tomar, se não me engano, 
De quem me descobriu, suma vingança, 
E não se acabará só nisto o dano
De vossa pertinace confiança; 
Antes em vossas náus vereis cada ano, 
Se é verdade o que meu juízo alcança, 
Naufrágios, perdições de toda sorte,
Que menor mal de todos seja a morte. 
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E do primeiro ilustre que a ventura
Com fama alta fizer tocar os céus, 
Serei eterna e nova sepultura
Por juízos incógnitos de Deus. 
Aqui porá da Turca armada dura 
Os soberbos e prósperos trofeus; 
Comigo de seus danos o ameaça
A destruída Quilôa com Mombaça. 
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Outro também virá de honrada fama, 
Liberal, cavaleiro e namorado, 
E consigo trará a formosa dama
Que Amor por grão mercê lhe terá dado. 
Triste ventura e negro fado os chama
Neste terreno meu, que duro e irado
Os deixará de um cru naufrágio vivos
Para verem trabalhos excessivos. 
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Verão morrer com fome os filhos caros, 
Em tanto amor gerados e nascidos; 
Verão os Cafres ásperos e ávaros
Tirar à linda dama seus vestidos;
Os cristalinos membros e perclaros
À calma, ao frio, ao verão despidos, 
Depois de ter pisada longamente
Com os delicados pés a areia ardente. 
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E verão mais os olhos que escaparem 
De tanto mal, de tanta desventura, 
Os dois amantes míseros ficarem
Na férvida e implacável espessura; 
Ali, depois que as pedras abrandarem
Com lágrimas de dor, de mágoa pura, 
Abraçados as almas soltarão
Da formosa e misérrima prisão. 
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Mas ai por diante o monstro horrendo
Dizendo nossos fados, quando alçado
Lhe disse eu: "Quem és tu? que esse estupendo 
Corpo certo me tem maravilhado."
A boca e os olhos negros retorcendo
E dando um espantoso e grande brado.
Me respondeu com voz pesada e amarga
Como quem da pergunta lhe pesara:
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"Eu sou aquele oculto e grande cabo
A quem chamais vós outros Tormentório, 
Que nunca a Ptolomeu, Pompônio, Estrabo, 
Plínio, e quantos passaram, fui notório. 
Aqui toda a Africana costa acabo
Neste meu nunca visto promotório,
Que para o polo Antártico se estende; 
A quem vossa ousadia tanto ofende. 
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Fui dos filhos aspérrimos da Terra, 
Qual Encelado, Egeo e o Centímano;
Chamai-me Adamastor, e fui na guerra
Contra o que vibra os ráios de Vulcano; 
Não que pusesse serra sobre serra
Mas conquistando as ondas do Oceano
Fui capitão do mar, por onde andava
A armada de netuno, que eu buscava. 
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Amores da alta esposa de Peleo
Me fizeram tomar tamanha empresa; 
Todas as Deusas desprezei do céu
Só por amar das águas a Princesa. 
Um dia a vi, com as filhas de Nereo
Sair nua na praia, e logo presa
A vontade senti de tal maneira, 
Que ainda não sinto coisa que mais queira. 
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Como fosse impossível alcançá-la
Pela grandeza feia de meu gesto, 
Determinei por armas de tomá-la,
E a Doris este caso manifesto.
De medo a Deusa então por mim lhe fala;
Mas ela com formoso riso honesto
Respondeu: "Qual será o amor bastante 
De Ninfa que sustente o de um Gigante? 
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Contudo por livrarmos o Oceano
De tanta guerra, eu buscarei maneira
Com que com minha honra, escuse o dano."
Tal resposta me torna mensageira. 
Eu que cair não pude neste engano
- Que é grande dos amantes a cegueira - 
Encheram-me com grandes abundâncias 
O peito de desejos e esperanças.
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Já nescio, já da guerra desistindo, 
Uma noite de Dóris prometida
Me aparece ao longe  o gesto lindo
Da branca Thetis, única, despida. 
Como doido corri, de longe abrindo 
Os braços, para para aquela que era vida
Deste corpo, e começo os olhos belos
A lhe beijar, as faces e os cabelos. 
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Ó que não sei de novo como o conte! 
Que crendo ter nos braços quem amava, 
Abraçado me achei com duro monte
De áspero mato e de espessura brava. 
Estando com penedo à fronte, 
Que eu pelo rosto angélico apertava, 
Não fiquei homem, não, mas mudo e quedo, 
E junto de um penedo outro peneo. 
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Ó Ninfa, a mais formosa do Oceano, 
Já que minha presença não te agrada, 
Que te custava ter-me neste engano, 
Ou fosse monte, nuvem, sonho, ou nada? 
Daqui me parto, irado e quase insano
Da mágoa e da deshonra ali passada, 
A buscar outro mundo onde não visse 
Quem de meu pranto e de meu mal se risse. 
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Eram ja neste tempo meus irmãos
vencidos e em miséria estrema postos, 
E por mais segurar-se os deuses vãos, 
Alguns vários montes sotopostos. 
E como contra o Céu não valem mãos, 
Eu que chorando andava meus desgostos, 
Comecei a sentir do fado amigo
Por meus atrevimentos o castigo. 
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Converte-se-me a carne em terra dura, 
Em penedos os ossos se fizeram, 
Estes membros que vês e esta figura
Por estas longas águas se estenderam; 
Enfim minha grandíssima estatura
Neste remoto cabo converteram
Os Deuses, e por mais dobradas mágoas
Me anda Thetis cerdando destas águas. 
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Assim contava, e com medonho choro 
Súbito de ante os olhos se apartou;
Desfez-se a nuvem negra, e com sonoro 
Bramindo muito longe o mar soou.
Eu levantando as mãos ao santo coro
Dos Anjos, que tão longe nos guiou,
A Deus pedi que removesse os duros 
Casos que Adamastor contou futuros. 
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BREVE BIOGRAFIA DE CAMÕES
                   Luiz de camões, o mais ilustre dos poetas portugueses, nasceu em Coimbra ou Lisboa, provavelmente no meio do terceiro mes do século XVI. 
                   A sua vida foi cheia de aventuras e adversidades, tendo frequentado por pouco tempo a corte de D. João III, da qual teve de se ausentar, segundo alguns autores, por causa de seus amores com D. Catarina de Ataíde, a dama da Rainha, que o próprio poeta imortalizou sob o nome de Natércia, teve de partir para Ceuta, onde perdeu um olho numa batalha com os mouros. Depois de ter estado preso em Lisboa durante um ano, no qual compos o primeiro canto dos Lusíadas. Partiu para aÍndia em 1553, tomando parte em várias expedições militares. Em Macau completou seis contos do poema, e, chamado a Gôa, naufragou na costa do Cambodja, salvando-se a muito custo, a nado, erguendo no braço esquerdo acima das ondas o manuscrito do seu poema. Durante algum tempo viveu entre os Budistas do cambodja; depois conseguiu chegar a Málaga e dai a Gôa em 1560. 
                   Em 1569 regressa definitivamente a Liboa, onde morre a 10 de junho de 1580.
                    Além dos Lusíadas escreveu também três outros: El Rei Seleuco, Anfitrião e Filodemo, além de um grande número de sonetos, canções, eclogas, elegias, odes, sextinas e oitavas, entre as quais verdadeiras obras primas. 
Nicéas Romeo Zanchett 








domingo, 22 de junho de 2014

A OCASIÃO - Por Nicolau Machiavel


A OCASIÃO
Por Nicolau Machiavel 
Quem es tu que mortal não pareces, 
De tanta graça o céu te adorna e dota? 
Porque não pousas, e asa ao pé forneces? - 
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Sou a Ocasião a muita gente ignota; 
E a razão de eu estar sempre trabalhando, 
É que um pé numa roda se me nota. 
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Não há voo que me iguale, eu caminhando, 
Por isso as asas nos meus pés mantenho
Para no meu correr ir enganando. 
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O meu solto cabelo adiante tenho, 
E com ele me cubro o peito e o rosto
Pra ninguém conhecer-me quando venho. 
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Atras da cabeça tudo calvo é posto; 
Qualquer cansa-se em vão, nem mais me apanha
Se já passei, ou se já não o arrosto. -
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Dize, quem essa é que te acompanha? - 
É Penitência; e saibas, vai notando. 
Quem pilhar-me não sabe, esta só ganha. 
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E tu em falar o tempo esperdiçado, 
De mil vãos pensamentos ocupado, 
Triste, não vês, não vais ainda atinando. 
Como eu das tuas mãos tenho escapado, 
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BREVE BIOGRAFIA  DE MACHIAVEL 
                Nicolau Machiavel, estadista e escritor italiano, nasceu em Florença a 3 de maio de 1469. Descendente de uma nobre mas pobre família. Pouco se sabe da sua mocidade, mas era muito inteligente e sagaz.   
               Em 1498 foi nomeado Secretário do Conselho dos Dez em Florença, empregando-se depois em numerosas missões diplomáticas aos estados da Itália, França e Alemanha, até a volta do expulso Médici em 1512; então foi demitido do seu cargo, preso e perseguido como suspeito de ter conspirado contra João de Médici. Quando o soltaram retirou-se para a sua "quinta" perto de São Cassiano, quando então passou a dedicar-se a trabalhos literários. Morreu em 21 de junho de 1527. As suas obras principais são: Il Principe, 1513; Historie Florentine; Arte de La Guerra; Discorsi; Madrágola e outras comédias. Além de diplomata, ficou conhecido como historiador e músico do Renascimento; é reconhecido como fundador do pensamento e da ciência política moderna por ter escrito sobre o Estado. Criou muitos pensamentos que são utilizados até hoje " A ambição do homem é tão grande que, para satisfazer uma vontade presente, não pensa no mal que daí a algum tempo pode resultar dela" - "Todos veem oque tu aparentas ser, mas poucos conhecem aquilo que tu és". 
Nicéas Romeo Zanchett 
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quinta-feira, 19 de junho de 2014

AMOR DA JUVENTUDE - Por Nicéas Romeo Zanchett


AMOR DA JUVENTUDE 
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Na flor da vida sonhei contigo, 
Sob a luz do lampião eu a via costurando,
Modulava um sorriso sob seu abrigo, 
Fazia-me feliz com seu perfume agreste.
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Um suave som de seus lábios se rompia, 
E seu canto iluminava meu caminho, 
Sob a pálida luz seu corpo eu via, 
Brilhar soberbo e beijar a sombra que o escondia. 
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Não descobri o prazer de suas carícias, 
Tão somente o delicado sabor de vê-la rindo. 
Minhas noites eram de fadas e feitiços, 
Mas o amor me embriagava com um sonho lindo.
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Junto às plantas do laranjal florido, 
O bosque acordava ao sabor da aurora, 
A coruja dava seu último gemido, 
E o pombo selvagem voava novamente. 
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Pungente, agora rola a saudade, 
Poeta e amante sonhei meu mundo, 
Afogado no amor e perdido na amizade, 
Num momento real e repleto de gozos. 
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A noite caí como um véu escuro, 
Cingindo-me os olhos com dilema de esperança. 
É brilhante o esplendor da estrela que me guia, 
Quando o peito arde de paixão e de lembrança.
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Nicéas Romeo Zanchett 

quarta-feira, 28 de maio de 2014

VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA - Manuel Bandeira


VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA
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Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei 
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
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Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana, a louca de Espanha, 
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive. 
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei um burro brabo, 
Subirei no pau de sebo, 
Tomarei banhos de mar! 
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu-menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada.
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Em Pasárgada tem de tudo,
é outra civilização.
 Tem um processo seguro
De impedir a concepção. 
Tem telefone automático, 
Tem alcaloide à vontade, 
Tem prostitutas bonitas
Pra gente namorar. 
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E quando eu estiver mais triste,  
Mais triste de não ter jeito, 
Quando a noite me der 
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei - 
Terei a mulher que quero 
Na cama que escolherei.
Vou-me embora pra Pasárgada. 
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 Manuel Bandeira 
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quarta-feira, 23 de abril de 2014

BELEZA E BONDADE - Por Safo, a poetisa de Lesbos

Pintura a óleo de Romeo Zanchett 
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BELEZA E BONDADE
Por Safo 
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Quando ávida contemplo a formosura, 
Tão breve é meu prazer que foge com ela; 
Mas bondade e lisura, 
Mas a inocência, oh! essa é sempre bela.
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Saiba tudo sobre a poetisa e sua Ilha de Lesbos clicando no Link abaixo 

CANTIGA ANACREÔNTICA - Por Marquesa D'Alorna


CANTIGA ANACREÔNTICA 
Por Marquesa D'Alorna 
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Dentre as canas buliçosas
Leve Zéfiro respira, 
Movem-se as folhas lustrosas,
Amor palpita e suspira. 
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Nestes doces movimentos
Vão-se as sombras desfazendo, 
Vão-se espreguiçando os Ventos, 
Lúcifer esmorecendo. 
Vai-se a manhã levantando, 
Acordam com ela as cores, 
Vão com ela despertando
 Pardas rochas, lindas flores. 
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Ante os raios refulgentes
Cessa o tímido  segredo, 
Abrilhantam-se as correntes, 
Nascem coros no arvoredo. 
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Sai do seio do descanso
Vigorada a fantasia; 
As ideias são mais claras 
Na hora em que nasce o dia. 
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Depois de um sono quieto
Tudo acorda com vigor; 
Porque razão quando dorme
Não desperta assim o amor?
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BREVE BIOGRAFIA 
           Dona Leonor d'Almeida Lorena e Lencastre, Condessa de Oeyenhausen, Marquesa D'Alorna, poetisa portuguesa, nasceu em Lisboa a 31 de Outubro de 1750 e morreu em Benfica a 11 de Outubro de 1839. Foi celebrada pelos poetas da Arcádia sob o nome de Alcype. Parte de sua infância passou-a no convento de Chellas por ordem do Marques de Pombal que mandou também encerrar seus pais e o irmão somente porque eram parentes dos Tavoras. Em 1779 desposou o conde de Oeyenhausen. Muito conhecida pelos seus talentos literários, deixou várias composições poéticas, umas originais e outras traduzidas por poetas célebres, que foram reunidas em 6 volumes. 
Nicéas Romeo Zanchett 
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A UMA ROSA - Por Marques Rodrigues


A UMA ROSA 
Por Marques Rodrigues 
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Minha rosa perfumada, 
Não deixes o Beija-flor
Beijar a folha agitada, 
Provar do mel o sabor! 
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Bem o sei, é bem formoso, 
E tu não podes negar 
O beijo ardente, amoroso
Na rubra face a escaldar...
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Que importa as cores que veste, 
A fúlgida cor do rubim, 
A esmeralda, o azul celeste
Nas asas tremendo emfim?

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Quem voa de rosa em rosa
Amor, constância não tem; 
A chama de amor mimosa
Ardendo em silêncio vem ...
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Ai não sejas imprudente, 
O' gentil, mimosa flor; 
Ao volúvel não constante
Provar do mel o sabor! 
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BREVE BIOGRAFIA 
           Antônio Marques Rodrigues, poeta brasileiro, nasceu em São Luiz a 15 de Abril de 1826 e faleceu em Avintes, Portugal, a 14 de Abril de 1873. Fez os seus primeiros estudos em Portugal. Viajou em seguida pela França e Inglaterra e, voltando ao Brasil, bacharelou-se em direito em pernambuco. Foi professor do liceu de São Luiz e deputado provincial por diversas vezes.  Suas poesias, esparsas em jornais e revistas, foram uma só voz e colecionadas nas Três Liras, 1862. 
Nicéas Romeo Zanchett


segunda-feira, 14 de abril de 2014

INDIFERENÇA - Por João de Deus


INDIFERENÇA 
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Ora diz-me a verdade: 
Tu já sentiste por mim 
Uma sombra de saudade
De amor, de ciume; emfim, 
Uma impressão que indicasse 
Haver em teu coração 
Fibra, corda que vibrasse 
À minha recordação? 
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Parece, mas o contrário; 
Sim, o que eu devo supor 
É deserto e solitário
O teu coração de amor! 
Não digo por outra; invejo
Talvez a sorte de alguém...
Mas o que eu seu, o que eu vejo, 
É que me não queres bem! 
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domingo, 23 de fevereiro de 2014

A CANÇÃO DO REI THULE - Por Goethe


A CANÇÃO DO REI THULER 
Por Goethe 
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Era uma vez um bom rei 
Em Thule - essa ilha distante. 
Ao morrer, deixou-lhe a amante
Um copo de ouro de lei. 
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Era um copo de ouro fino
Todo lavrado a primor; 
Se fosse o cálix divino
Não lhe tinha mais amor. 
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Seus tristes olhos leais
Não tinham outra alegria; 
E só por ele bebia, 
Nos seus banquetes reais. 
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Chegada a hora da morte
Pôs-se o rei a meditar
Grandeza da sua sorte
Seus reinos à beira-mar. 
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Deixava um rico tesouro,
Palácios, vilas, cidades; 
De nada tinha saudades, 
A não ser do copo de ouro .
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No castelo da  devesa, 
Naquelas salas sem fim, 
Mandou armar uma mesa
Para um último festim.  
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Convidou sem mais tardar 
Os seus fieis cavaleiros, 
Para os brindes derradeiros
No castelo à beira-mar. 
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Então, vazando-o de um trago, 
E com entranhada mágoa, 
Pôs nas ondas o olhar vago
E atirou com a taça à água.  
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Viu-a boiar suspendida, 
Até que as ondas a levaram; 
Os olhos se lhe toldaram, 
E não bebeu mais em vida!
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Goethe 
Nicéas Romeo Zanchett 

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Y - JUCA - PYRAMA - Por Gonçalves Dias

Y - Juca - Pyrama (Sc.de Sá) 

PRIMEIROS VERSOS 
No meio das tabas de amenos verdores, 
Cercados de troncos - coberto de flores, 
Ateiam-se os tetos da altiva nação; 
São muitos seus filhos, no ânimos fortes, 
Temíveis na guerra, que em densas cortes
Assombram das matas a imensa extensão. 
São rudos, severos, sedentos de glória, 
Já prélios incitam, já cantam vitória, 
Já meigos atendem à voz do cantor; 
São todos Timbiras, guerreiros valentes! 
Seu nome lá voa na boca das gentes, 
Condão de prodígios, de glória e terror! 


As tribos vizinhas, sem forças, sem brio, 
As armas quebrando, lançando-as ao rio, 
O incenso aspiram dos seus maracás; 
Medrosos das guerras que os fortes acendem, 
Custosos tributos ignavos lá rendem, 
Aos duros guerreiros sujeitos na paz. 


No centro da taba se estende um terreiro, 
Onde ora se aduna o concílio guerreiro
Da tribo senhora, das tribos servis; 
Os velhos sentados praticam d'outrora, 
E os moços inquietos, que a festa enamora, 
Derramam-se em torno dum índio infeliz. 


Quem é? - ninguém sabe; seu nome é ignoto, 
Sua tribo não diz; - mas de um povo remoto 
Descende por certo - dum povo gentil; 
Assim lá na Grécia ao escravo insulano 
Tornavam distinto do vil muçulmano
As linhas corretas do nobre perfil. 


Por casos de guerra caiu prisioneiro
Nas mãos dos Timbiras; - no extenso terreiro
Assola-se o teto que o teve em prisão; 
Convidam-se as tribos dos seus arredores, 
Cuidosos se incumbem do vaso das cores, 
Dos vários aprestos da honrosa função. 
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Acerta-se a lenha da vasta fogueira, 
Entesa-se a corda da embira ligeira, 
Adorna-se a maçã com penas gentis; 
A custo entre vagas do povo da aldeia
 Caminha o Timbira, que a turba rodeia, 
Garboso nas plumas de variado  matiz. 


Em tanto as mulheres com leda trigança, 
Afeitas ao rito da bárbara usança, 
O índio já querem cativo acabar; 
A coma lhe cortam, os membros lhe tingem, 
Brilhante enduape  no corpo lhe cingem, 
Sombreia-lhe a fronte gentil Canitar.


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BREVE BIOGRAFIA 
Antônio Gonçalves Dias, poeta brasileiro, nasceu em Caxias, Maranhão, a 10 de Agosto de 1823, e faleceu a 3 de Novembro de 1864 no naufrágio do Ville de Boulogne. Foi estudar em Portugal onde fez os preparatórios e o curso de direito na Universidade de Coimbra. Voltando ao Brasil dedicou-se à advocacia que abandonou pouco tempo depois, sendo nomeado lente de história e latinidade no Colégio de D. Pedro II. Era sócio do Instituto Histórico e Geográfico brasileiro e de outras associações literárias. É considerado um dos poetas que mais contribuiu para a libertar a poesia brasileira do classicismo. Escreveu: Primeiros Contos, 1846; Segundos Contos e sextilhas de Frei Antão, 1848; Últimos Contos, 1850; Leonor de Mendonça (drama); Boabdil (drama inédito), 1865; etc. Contribuiu também com memórias muito interessantes para a Revista do Instituto Histórico; O Brasil e a Oceania. 
Nicéas Romeo Zanchett 

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