A LAGOA DOS AMORES
Era uma vez, alta noite,
Nas horas do ressonar,
Caminhava um marinheiro
Pelas encostas do mar,
Esta cantiga cantando,
Capaz de fazer chorar.
.
"No oceano da existência
Marinheiro viajei,
Dentro da gentil lagoinha
Que mocidade chamei,
Onde eu era todo ufano
Como em seu palácio um rei. "
.
"Era piloto a Esperança
Da barquinha tão gentil,
Toda pintava de listras
Cor de Rosa, cor de anil,
Singrado, como a gaivota
Entre as ondas, senhoril."
.
"Quando as velas se entufavam
Das brisas do Norte ou Sul,
Era a barquinha uma garça
Pairando num lago azul;
Nunca um Doge de Veneza
Teve um batel mais taful. "
.
"Sulcando os mares da vida,
Parece que a vejo assim;
Sorrindo a esperança do leme,
Sorrindo a esperança pra mim
Docemente reclinado
Das crenças no camarim. "
.
" E quando o mar se encrespava
A peso do furacão
Vogava aquela barquinha
Qual outra nunca vi, não;
Sem ouvir a voz de - voga!
Do piloto ou capitão. "
.
"Na calmaria ou remanso,
Na vazante ou preamar,
Quando a barca adormecia
Das ondas ao murmurar,
Eu da proa assim cantava
Para a barquinha acordar:
.
"- Desperta, gentil barquinha,
Que a procela pode vir,
Pode o - Porto Futuro
À nossa vista encobrir;
Voga, voga, Mocidade,
Busca as praias do - Porvir!"
.
"E a barquinha despertava,
E, rompendo a calmaria,
Singrava sobre o remanso
Como se fosse em porfia;
Mas, um dia... oh! bem me lembro
Dos cachopos desse dia! "
.
"Na lagoa dos amores
A barquinha navegou,
Sopra o vento contra a popa,
E a coitada naufragou!
Piloto que a pilotava
Nunca tão mal pilotou!..."
.
"Parte a quilha contra as rochas,
Das ondas ao escarcéu
Assombrou-se a Mocidade,
E o piloto pereceu!
O capitão deu na costa
Do - Futuro que perdeu..."
.
"Foi ter naufrago nas praias
Das - desilusões de amor,
Quase morre de fadiga,
Da tormenta no rigor,
Arribando noutro porto
O triste navegador!"
.
"Bateleiro sem barquinha
Não pode mais viajar;
Marinheiro que naufraga
Não deve mais navegar;
Adeus, lagoa de amores,
Não posso mais embarcar!"
.
"Assim cantava alta noite,
Nas horas do ressonar,
Caminhando um marinheiro
Pelas encostas do mar;
Não é mais triste a cantiga
Do que era o triste cantar."
.
BIOGRAFIA DO AUTOR
Bruno Seabra, literato e poeta brasileiro, nasceu no Pará em 1837. Autor de Flores e Frutos, aninhas e sertanejos. Morreu em 1876.
Nicéas Romeo Zanchett
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