TROMBA MARINHA
Retirado dos Lusíadas de Luiz de Camões
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Os casos vi, que os rudos marinheiros,
Que tem por mestra a longa experiência,
Contam por certo sempre, e verdadeiros,
Julgando as coisas só pela aparência,
E que os que tem juízos mais inteiros,
Que só por puro engenho e por ciência
Vêem do mundo os segredos escondidos,
Julgam por falsos, ou mal entendidos.
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Vi claramente visto o lume vivo
Que a marítima gente tem por santo,
Em tempo de tormenta e vento esquivo,
De tempestade escura e triste pranto.
Não menos foi a todos excessivo
Milagre, e coisa certa de alto espanto,
Ver as nuvens do mar, com largo canto,
Sorver as alfas águas do oceano.
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Eu vi certamente (e não presumo
Que a vista me enganava) levantar-se
No ar um vaporzinho de sutil fumo
E do vento trazido, rodear-se;
De aqui levado um cano ao polo sumo
Se via, tão delgado que enxergar-se
Dos olhos facilmente não podia;
Da matéria das nuvens parecia.
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Ia-se pouco a pouco acrescentando,
E mais que um largo mastro se engrossava;
Aqui se estreita; aqui se alarga, quando
Os golpes grandes de água em si chupava;
Estava-se co'as ondas ondeando;
Em cima dele uma nuvem se espessava,
Fazendo-se maior, mais carregada
Co'o cargo grande d'água em si tomada.
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Qual roxa sangrenta se veria
Nos beiços da alimária (que imprudente,
Bebendo a recolheu na fonte fria)
Fartar co'o sangue alheio a sede ardente;
Chupando mais e mais se engrossa e cria,
Ali se enche e se alarga grandemente;
Tal a grande coluna, enchendo, aumenta
A si e a nuvem negra que sustenta.
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Mas depois que de tudo se fartou,
O pé que tem no mar a si recolhe,
E pelo céu chovendo enfim voou,
Porque co'a água a jacente água molhe;
Às ondas torna as ondas, que tomou,
Mas o sabor do sal lhe tira o tolhe.
Vejam agora os sábios na escritura,
Que segredos são estes da natura!
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NOTA
Retirado dos Lusíadas de Luiz de Camões e adaptado para a nossa linguagem atual.
Nicéas Romeo Zanchett
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