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quarta-feira, 18 de setembro de 2013

AINDA UMA VEZ, ADEUS! Por Gonçalves Dias


AINDA UMA VEZ, ADEUS!
Por Gonçalves Dias
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Emfim te vejo! emfim posso, 
Curvado a teus pés, dizer-te 
que não cessei de querer-te, 
Pesar de quanto sofri. 
Muito penei! Cruas ânsias, 
De teus olhos afastado, 
Houveram-me acabrunhado
A não lembrar-me de ti!
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De um mundo a outro impelido
Derramei os meus lamentos
Nas surdas azas dos ventos, 
Do mar na crespa cerviz! 
Baldão, ludibrio da sorte, 
Em terra estranha, entre gente
Que alheios males não sente,
Nem se condói do infeliz!  
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Louco, aflito, a saciar-me 
De agravar minha ferida, 
Tomou-me tédio da vida, 
Passos da morte senti; 
Mas quase no passo extremo, 
No último arcar da esperança, 
Tu me vieste à lembrança, 
Quiz viver mais e vivi!
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Vivi, pois Deus me guardava
Para este lugar e hora!
Depois de tanto senhora!
Ver-te e falar-te outra vez; 
Rever-me em teu rosto amigo, Pensar em quanto hei sofrido
E este pranto dolorido
Deixar corre a teus pés. 
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Mas que tens? Não me conheces?  
De mim afastas teu rosto?  
Pois tanto pode o desgosto
Transformar o rosto meu? 
Sei a aflição quanto pode,
Sei quanto ela desfigura, 
E eu não vivi na ventura...
Olha-me bem, que sou eu!
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Nem uma voz me diriges! 
Julgas-te acaso ofendida? 
Deste-me amor, e a vida
Que me darias, bem sei; 
Mas lembrem-te aqueles feros 
Corações que se meteram
Entre nós; e se venceram, 
Mal sabes quanto lutei!
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Oh! se lutei! Mas devera 
Expor-te em pública praça 
Como um alvo à populaça,
Um alvo aos ditérios seus?
Devera, podia acaso, 
Tal sacrifício aceitar-te, 
Para no cabo pagar-te, 
Meus dias unindo os teus? 
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Devera, sim; mas pensava
Que de mim te esquecerias, 
Que, sem mim, alegres dias 
Te esperavam; e era favor 
De minhas preces, contava
Que o bom Deus, me aceitaria
O meu quinhão de alegria
Pelo teu quinhão de dor!
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Que me enganei, ora vejo;
Nadam-te os olhos em pranto,
Arfa-te o peito, e no entanto
Nem me podes encarar; 
Erro foi, mas não foi crime; 
Não te esqueci, eu to juro, 
Sacrifiquei meu futuro, 
Vida e glória por te amar!
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Tudo, tudo; e na miséria 
De um martírio prolongado, 
Lento, cruel, disfarçado
Que eu nem a ti confiei;
"Ela é feliz (me dizia)
Seu destino é obra minha". 
Negou-mo a sorte mesquinha...
Perdoa, que me enganei!
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Tantos encantos me tinham, 
Tanta ilusão me afagava 
De noite, quando acordava,
De dia em sonhos talvez!
Tudo isso agora onde para? 
Onde a ilusão dos meus sonhos
Tantos projetos risonhos, 
Tudo esse engano desfez! 
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Enganei-me! - Horrendo chãos 
Nessas palavras se encerra, 
Quando do engano, quem erra, 
Não pode voltar atras!
Amarga irrisão! Reflete; 
Quando eu gozar-te pudera, 
Mártir quis ser, cuide que era..
E um louco fui, nada mais!
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Louco, julguei adornar-me
Com palmas de alva virtude! 
Que tinha eu, bronco e rude, 
Com o que se chama ideal? 
O meu eras tu, não outro;
Estava em deixar minha vida
Correr por ti conduzida, 
Pura, na ausência do mal. 
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Pensar eu que o teu destino 
Ligado ao meu, outro fora; 
Pensar que te vejo agora, 
Por culpa minha, infeliz;
Pensar que a tua ventura
Deus "ab eterno" a fizera, 
No meu caminho pusera...
E eu... fui eu que a não quis!
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És de outro agora e pra sempre! 
Eu a mísero desterro
Volto chorando o meu erro, 
Quase descrendo dos céus. 
Dói-te de mim, pois me encontras
Em tanta miséria posto, 
Que a expressão deste desgosto 
Será um crime ante Deus!
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Dói-te de mim, que te imploro
Perdão, a teus pés curvado; 
Perdão de não ter ousado
Viver contente e feliz!
Perdão da minha miséria, 
Da dor que me rala o peito, 
E, se do mal que te hei feito, 
Também do mal que me fiz!
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Adeus, que eu parto, senhora;
Negou-me o fado inimigo
Passar a vida comigo, 
Ter sepultura entre os meus; 
Negou-me nesta hora extrema
Por extrema despedida, 
Ouvir-te a voz comovida, 
Soluçar em breve adeus! 
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Lerás, porém, algum dia 
Meus versos, da alma arrancados, 
De amargo pranto banhados, 
Com sangue escritos, e então, 
Confio que te comovas, 
Que a minha dor te apiade, 
Que chores, não de saudade, 
Nem de amor: - de compaixão!
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Pesquisa e postagem: Nicéas Romeo Zanchett 






segunda-feira, 16 de setembro de 2013

AMIZADE QUEBRADA - Por Samuel Taylor Coleridge


AMIZADE QUEBRADA 
Por Samuel Taylor Coleridge 
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Eram amigos na mocidade; 
Mas línguas vis ferem a verdade
E só do céu da constância a chama, 
E a juventude é vaidosa, e dura
A vida. O irar-se contra quem se ama
cai sobre o espírito como uma loucura...
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De alto desdem ambos eles falaram, 
Cada um àquele que mais amou; 
E para sempre se separaram!
Mas nenhum deles outro encontrou
Que lhe aliviasse a alma entristecida; 
Ficaram à parte sondando a ferida, 
Sós, quais rochedos; o mar sombrio, 
Somente hoje entre eles mora; 
Mas não há raio, calor nem frio
Que possa de todo apagar agora
Sinais daquilo que foi outrora.
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BREVE BIOGRAFIA 
Samuel Taylor Coleridge, poeta inglês, nasceu em Ottery St.mary, a 21 de outubro de 1772. frequentou a Universidade de Cambridge, tomando grau em 1792. Com Southey e outros formou oprojeto de um estabelecimento comunista na América, mas ficou na Inglaterra, dedicando-se á literatura. O seu primeiro volume de versos apareceu em 1794; colaborou nas Lyrical Ballads (Baladas Líricas), com Wodsworth em 1798. Fora destes , os seus principais poemas são Chistabel e Kubla Khan. Foi também prosador, escrevendo sobre literatura e filosofia. Faleceu a 25 de Julho de 1834. 
Nicéas Romeo Zanchett 
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LUCY - Por Guilherme Wordsworth - Trad. Fernando Pessoa


LUCY 
Obra de Guilherme Wordsworth 
Tradução de 
Fernando Pessoa 
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De ínvias fontes ao pé vivia ela, 
E de escusos caminhos; 
Ninguém dava louvores à donzela, 
Muito poucos, carinhos; 
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Uma violeta de uma pedra ao pé, 
Meio oculta ao olhar! 
- Bela como uma estrela quando é 
A única a brilhar! 
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Viveu só. Pouca gente saberia
Quando foi seu fim; 
Mas está morta, morta, e - oh agonia! - 
A diferença pra mim!...
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Três anos, noite e dia, cresceu ela, 
E a natureza disse: "Flor mais bela
Nunca a terra antes tinha"; 
Tomarei para mim esta criança, 
E farei dela, com sutil mudança
Uma senhora minha. 
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" À minha predileta impulso e lei
Saberei ser, e ao pé de mim farei
Que ela possa sentir
Em céu e terra, na floresta ou mar, 
Um Supremo Poder para a animar
Ou para dirigir. 
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Ela alegre será como a donzela
Que corre louca pelo prado, ou pela 
Fria montanha aérea; 
Dela será a fresca e simples alma, 
Cheia de grave e silenciosa calma
Das coisas da matéria. 
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Às nuvens dar-lhe-hão a sua graça, 
E o vime a sua, quando o venta passa; 
Nem lhe será escuro
Na própria tempestade o ritmo informe
Que em beleza o seu corpo vigem forme
Por um influxo obscuro. 
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As estrelas da noite ser-lhe-hão caras, 
O ouvido inclinará para as fontes claras, 
E onde a aragem passe
E os cantos dos rivais riachos misture-os;
E a beleza nascida dos murmúreos
Passar-lhe-há para a face. 
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E vitais sentimentos de alegria
dar-lhe-hão a graça desenvolta e esguia, 
E à tez suave matiz; 
Darei a Lucy estes pensamentos, 
E viveremos límpidos momentos
Nesta estância feliz."
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 E a natureza fez como falou. - 
Mas ah! quão cedo Lucy nos deixou! 
Morreu, deixou-me cá
Este prado, esta calma que me dói, 
A memória de tudo quanto foi 
E nunca mais será. 
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Um sono o meu espírito fechava
Pra receios humanos; 
Ela parecia coisa já não escrava 
Do contato dos anos. 
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Já não ouve nem vê, nem força nua
Ou movimento encerra; 
Arrastada com a rocha e a erva sua
Na rotação da terra. 
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   BREVE BIOGRAFIA 
Guilherme Wordsworth, poeta inglês, nasceu em Cockermouth a 7 de Abril de 1770 e foi educado em Hawkshead e na Universidade de Cambridge. Percorreu a França e a Suíça em 1791 e 1792, e as sua impressões da Revolução estão descritas no Prelude. Em 1798 apareceram Lyrical Ballads e em 1814 The Excursion. Entre os outros seus poemas contam-se The White  Doe of Rylstone ( A Corça Banca de Rylstone), 1815; Peter Bell e The Waggoner (O carreiro), 1819; Sonnetz (1838). Morreu a 23 de Abril de 1850.
Nicéas Romeo Zanchett 
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